Estávamos
jogando sinuca. Tudo sempre começa assim, jogando sinuca, um amigo e eu. Neste
dia, o amigo em questão era conhecido por "o Grande". Bem, ele não era tão grande
assim como as pessoas comentam. Aliás era bem mirrado, um metro e setenta no
máximo, mas quando entrava numa briga... Se tornava. Não estávamos afim de confusão. Os punhos ainda não tinham voltado ao normal desde a última incursão
noturna, mas não vem ao caso. O caso mesmo era que estávamos jogando sinuca.
- "Sabe,
aqui tá massa, mas tá faltando alguma coisa."
- "O que,
Grandão, mais briga?!" Respondi de imediato.
- "Não, não.
Tá faltando mulher, Cara. Vá me arranjar uma que eu compro as cervejas da
noite."
Como era de
costume, meus companheiros de noites sempre me compravam com alguma coisa. Em
geral, Jack Daniels, mas Grandão estava pobre naquela ocasião.
Dei a volta
no bar, olhei para algumas mesas. Achei o de sempre: playbas, algumas
putas e, enfim, algo que o valha. Duas peças da mais fina categoria. Não eram
muito bonitas, mas ainda tínhamos abastecimento de cerveja. Depois de algumas
dez, talvez pudessem ficar melhorzinhas. Talvez.
O desafio estava na minha frente, então fui atrás para ter o que beber mais pra frente. Cheguei
perto a ponto de vez uma jogada. As meninas jogavam relativamente bem, mas não
estavam lá para isso. A mesa estava uma droga. Todas as bolas no canto e
nenhuma tacada interessante poderia mudar alguma coisa, só se elas fossem muito
estrábicas para conseguir, ou ainda se tacasse na sete para
acertar de canto a cinco, mas, vamos combinar que nesta situação raciocinar
como bons jogadores estava fora de questão.
A jogada se
fez como imaginado, a morena acertou a cinco e a fez rolar a mesa inteira sem
triscar em nada e nem acertar alguma coisa. Eu, como uma pessoa que
estava afim de puxar uma conversa, só pude soltar um sorriso. A outra morena
riu, o que me deu brecha para poder iniciar o assunto.
- "O que
foi?"
- "Oi? Estava vendo vocês aí jogarem, e tal, e pensei: tem duas aqui, dois ali do
lado, que tal montarmos um joguinho de par?". Investi.
A morena da
tacada veio arisca.
- "Oche,
quem tu pensa que tu é pra pensar que a gente vai?"
- "Mulher,
deixa eu te explicar duas coisas. Você tem dinheiro?"
- "Não
muito."
- "Então,
nós tem seiscentas pilas para gastar hoje. Não que isso seja uma oferta por
nossa intenção futura com vocês. Segunda coisa, duas andorinhas não faz verão,
mas quatro faz filhote. Vem logo pra nossa mesa." De imediato
elas toparam. Não custava nada. Aliás, custaria umas boas risadas e, quem sabe,
algum futuro.
Voltei com
as meninas para a mesa e o Grande me olhou com uma cara de “Já? Nem comprei as
birita!”. O jogo de
par se deu da seguinte forma: a morena 01, se chama Marta, e a 02 era Dayse. Assim em inglês, bem cara de puta. Colei na Marta pela
estupidez, mesmo porque alguém com nome Dayse só poderia ser muito fácil mesmo.
O Grande deu um outro nome, Gustavo, nome de playba. Piscou pra mim para eu confirmar. Eu me chamei de Jucelino, tem mais cara de peão mesmo.
Na primeira
partida, Gustavo não deixou barato e limpou metade da mesa em duas tacadas. Uma
proeza, já que ele era mais estrábico que burro de cabresto. Fui deixando ele
enrolar, afinal, quem iria pagar a conta mesmo? Quando estávamos colocando a
ficha para a segunda partida, percebi de canto de olho que um playbazinho,
muito do enjoado, começou a encarar o Grande. Claro que ele não notou. Então
fiquei quieto só pra ver no que ia dar.
Com as
bolas na mesa, Dayse ia dar a primeira tacada quando um dos caras veio na
grosseria.
- "Olá,
belas pernas. A que horas elas abrem?"
- "Nem nas
suas bronhas mais insanas."
O Grande
ouviu e deu uma risadinha. O cara virou
pra ele e disse:
- "Tá rindo
de que?"
Segurou
mais forte o taco e em seguida começou:
- "Esse é
meu curral, não mexa no meu gado."
Não havia
muito espaço para levar o taco na cara do playba. Então o cara investiu primeiro e o empurrou. No
desequilíbrio, o Grande percebeu que abriu um espaço e acertou o taco na cara
dele, o quebrando em dois. Eu ainda estava rindo, quando o amigo do playba veio pra cima. Essas coisas são difíceis de contar, mas em um único lance eu o agarrei pela gola e o joguei em cima da mesa. Só para não dizer que sou uma
pessoa pouco empolgada, ao fundo Motorhead com Killed by Death veio para
aumentar a força dos socos que dei na cara dele. Mas antes disso, fiz a
pergunta padrão:
- "Qual o
seu nome, filha da puta?"
O cara olhou com espanto e logo retrucou: "Que?!"
- "Resposta
errada". Mais um soco. "QUAL. É. O. SEU. NO-ME, FILHADAPU-TA?"
Com o susto, respondeu: "Henrique,
por quê?!"
- "Pra criar intimidade."
Um soco no
queixo, outro na orelha, mais uns três na boca, no olho e para dar aquela
finalizada (é importante fazer essas coisas com calma), subi mais um pouco e meu joelho em seu nariz. Pronto, tava feito. Aí o esquema que já estávamos habituados:
segurança vem, nos joga pra fora, a ambulância chega pra buscar os
infelizes, a polícia passa pela gente sem nem notar que poderíamos ter algo a
ver com isso e duas garotas, as mesmas (lógico), olhando meio estasiadas com a
situação.
Dayse olhou pro Grande e perguntou: "Cês tão
bem?". Um "Ah, te fuder!" sonoro foi a resposta.
- "Calma,
calma. Amigo, amigo". Parecia preocupada, mas era assanhamento mesmo. Pedi
desculpa, enquanto Gustavo-fake-Grande xingava a mãe, o pai, a Xuxa e Deus.
Uma conversa amistosa se iniciou. Demos uma volta no quarteirão até o carro
delas, que estava um tanto longe. Deus, como desejei que o carro estivesse mais
perto. Enfim. Marta olhou pra mim e disse:
- "Sou
enfermeira. Se quiser, vamos pra minha casa e eu lhe ajudo com curativos".
- "Que isso
mulher! Enfermeira só me lembra injeção... Ah, entendi!". Não me culpe, nessas horas a gente nem tem ideia do que as pessoas querem...
Não vi mais
o Grande por perto. Deve ter ido embora com Dayse, afinal ela tem
nome de flor. Deve cheirar alguma coisa. Acordei umas 13h, com uma ressaca
infernal. Achei minha cueca, calça e coturno e antes de que Marta pudesse ver alguma coisa, eu
já estava descendo o prédio. Andei por três
quadras até o meu telefone tocar.
- "Fala fio! Só o oro?", falei. Do outro lado da linha, o Grande.
- "Se é".
- "Mais uma
dessas e perco meus escrúpulos."
- "Só se for virar letra de música."