O dia em que me apaixonei pela última vez

Era o dia do meu aniversário de 25.

Seis dias antes, havia sido minha formatura. Distanciei-me de meu início de carreira como jornalista para ser Garçonete. Isso mesmo, trabalhando em um bar medieval da cidade.

Pode parecer estranho, mas a mulher que eu era à época é muito diferente do que sou hoje, principalmente, pelas escolhas que fiz e que fizeram por mim neste tempo.

Como todo conto de fadas, a história se passa à noite. Fiquei a tarde inteira dentro da taberna recebendo treinamento do cardápio da casa. Muitos pratos para decorar e drinks, muitos outros drinks. Sempre gostei de público, mas durante os dois meses em que trabalhei na casa, passei por bocados e bocados de humilhação. Estava em início de vida, comecei a não me importar a lavar banheiros e limpar mesas. Passei a ouvir muita grosseria. Algumas delas eram praticadas como gente como eu, que tinha de tudo e não me importava em destratar pessoas menos abastadas.

Você deve começar a pensar que eu era uma pessoa bem financeiramente, mas não o fui. morava há 38 quilômetros do centro da cidade e minha família sempre passou por dificuldades financeiras. Minha mãe sempre fez questão de proteger, minha irmã e eu, do mundo aqui fora. E me acostumei a achar que nada de ruim iria acontecer comigo.

A noite estava para começar, então após o treinamento, o dono da taberna nos incitou a continuar na casa e ver como era o movimento. Não demorou muito para começar a servir mesas e me apresentar aos outros garçons. Todos muito jovens, entre 19 a 23 anos. Estava me sentindo nervosa, mas uma injeção de energia me contagiava a continuar a ficar em pé e a sorrir. No final do expediente, por volta das 01h, iria para casa de meu namorado. Então o barman mais carrancudo do mundo veio em minha direção e perguntou-me se eu tinha carro. Disse que sim. Em seguida, perguntou-me se poderia lhe dar uma carona até a rodoviária central. Disse que não haveria problemas.

Nos tornamos amigos da forma mais estranha. Em menos de uma hora conversando antes de entrar no carro, descobri que o cara carrancudo e que tinha cara de mau, era mau mesmo. Com cicatrizes da rua, história de vida conturbada e que parecia não sorrir nunca. O deixei na rodoviária e demos início a uma amizade sólida. Apesar das dores, ele era um cara legal. Precisava apenas dar uma oportunidade de nos conhecermos. E deu certo.

Este foi uma de tantas noites na taberna entre risos, cigarros, cerveja e sinuca. Sempre depois do expediente,  sempre conversávamos. Às quartas, ficávamos até 02h30 da manhã jogando conversa fora e falando um pouco sobre nossa trajetória. Assim como todas as minhas melhores amigas, comigo há mais de 10 anos, o contágio foi quase que imediato. Tudo parecia engraçado e fora do normal perto dele. Me sentia feliz, mesmo não sabendo que este sentimento pode ser confundido por tantos outros como uma afinidade surreal. Éramos assim. Amigos.

Lembro-me que quando minha mãe passou por uma cirurgia difícil, ele estava a meu lado, amparando minhas lágrimas. Apenas sete dias depois em que nos conhecemos.

E toda história em que a mocinha se apaixona pelo ladrão é verdade. Mas isso, eu só pude notar depois de um ano, muitas confusões e uma única pessoa a meu lado.


você.